26 dezembro 2020

Angola - #8.10

Desde que entramos na província de Kwanza Sul, e em particular no município da Cela, saltavam à vista as novas construções habitacionais.

A Aldeia Nova é um projeto de desenvolvimento socioeconómico, baseado na disponibilização (a troco de uma "pequena maquia") de terrenos, casas e infraestruturas, à população.
"Uma Esperança, Um caminho, Uma realização" é o seu mote e teve inicio logo após o fim da guerra em Angola, em 2003.
É um projeto de origem e investimento israelita (sim, israelita!...), com uma organização baseada em kibutz.


Casas novas, bem alinhadas, com aspeto de ainda não estarem a ser habitadas.
Mas muitas delas já estavam.
Sendo um projeto que pretendia criar condições de vida para milhares de famílias que tinham ficado totalmente "descalças" com a guerra, teve um arranque difícil. Na altura em que por ali passamos, a coisa não estava fácil.
Em 2018, as notícias relatavam progressos enormes. Mais do que a produção agrícola, a produção pecuária e industrial, de leite, ovos, óleo, refeições embaladas, ..., está "lá em cima".


Mas, para não variar, nem tudo são rosas. Em notícia desta semana, é relatado que "os trabalhadores são sujeitos a trabalho de escravatura moderna".
Dentro de muitas, uma das queixas é a falta de (prometidas) escolas nas aldeias, que obriga os alunos a caminhadas diárias de 5 a 12 km. Não sei da distância, mas assisti a dezenas de miúdos a caminhar nas bermas da estrada, com a sua cadeirinha de plástico à cabeça.
Como o próprio responsável do projeto, israelita, reconhece: "foi um projecto (social) do Estado que não vingou..."

Mas o conceito, de uma forma geral, parece-me bom. 
Se não for estragado por "outros interesses", talvez daqui a mais uns anos...


A meia distância entre Waku Kungo e Ebo, passagem num monumento que se destaca claramente na paisagem, uma igreja, católica, segundo o Google maps.
Tinha recebido recentemente obras de recuperação, pois um ano antes o aspeto era este, de abandono.

Mais um exemplo das sempre constantes queimadas/incêndios postos.


Campos a perder de vista... 
Verdes e aparentemente em repouso (eventualmente por não haver, ainda, quem os trabalhasse)
O fumo, esse, sempre presente.


Para haver verdura tem de haver água e é o que por ali não falta.
Água, muita água....
Mas aqui (já) não há crocodilos.



Era sábado. Não sei se seria por isso, mas havia imensa gente na estrada, a viajar.
Em todos os dias que viajamos pelas estradas angolanas via-se carros todo-terreno, principalmente Toyotas, todos equipados para longas viagens. Overlanders.
Na fotografia seguinte, um longo "comboio" de viajantes sul-africanos.
O site escrito no para-brisas deste primeiro carro já não existe. Na pesquisa, encontrei um tema lateral, mas igualmente interessante: "treino de sobrevivência".


Mas circular nas estradas angolanas está longe de ser seguro!
Os "cartazes" que nos fazem recordar deste facto aparecem em todos os cantos, esquinas... e em todas as retas.

Na fotografia seguinte, algo quase pornográfico: um Pajero 2800 totalmente desnudado.
Se não fosse tão mau, seria cómico...



Ebo é uma cidade e sede de município. 
No entanto, e comparativamente com outras, é minúscula. Essencialmente, são "meia dúzia" de casas e... muitos campos agrícolas.
Fiquei-me pelo pormenor da jovem, que transportava à cabeça uma bacia carregada de lenha. 
Para o fogão?...



Não era eu o condutor de serviço e dava para ir desviando o olhar da estrada...

A montanha imediatamente a sudeste de Quibala estava recoberta com as cores nacionais, mas portuguesas ;)
Em vermelho e verde.


Não fosse o fumo, ficava lindíssimo (digo eu ;)


Nesta zona mais rural do país não são muitos os "vendedores de estrada", tão comuns junto às grandes cidades.
A fotografia seguinte, feita de passagem, por ter achado curioso o colorido na paisagem, criou-me bastantes dificuldades de identificação. O que estão a vender estes miúdos?
Uns troncos/raízes, com uma madeira cor de laranja, que nunca cheguei a ver à venda em mais lado nenhum.
Para chegar a ela só mesmo com a ajuda dos meus sogros: raíz de borututu (ou brotutu, como às vezes aparece escrito e foneticamente se pronuncia), nome comum da planta Cochlospermum angolense, usado para chá. 
Pelos vistos, dizem os ervanários, tem propriedades reconhecidas no tratamento de problemas do estômago, do fígado, ...,  e para combater o colesterol.
Vou ter de ver isto... ;)




23 dezembro 2020

Angola - #8.9

Era uma e um quarto da tarde e faltavam mais de 500 km até Luanda.
Voltamos à viagem e às longas retas.


De passagem, pormenor das casas naturalmente coloridas, construídas de tijolos de barro vermelho.
Terra ferrosa, oxidada.


Já em posts anteriores coloquei fotografias com registo dos incêndios que se vêm por quase todo o lado.
Conhecia a prática de queimar as terras para preparação do terreno para a agricultura, mas o número de incêndios em Angola é fora daquilo que consideraria como "normal".
Resolvi pesquisar sobre o assunto e cheguei à conclusão que tinha razão. De facto, não é normal.

As queimadas são proibidas, mas como é uma tradição que vem de longe... é difícil de abandonar.
As áreas queimadas são enormes, com os incêndios fora de controlo. São imensas as notícias dos danos destes incêndios. Os estragos acumulam-se.
A coisa mais estranha, para mim, é a utilização destas queimadas para a caça, principalmente do animal caçado, o "rato monteiro".
São tantos, que Angola lidera a lista mundial com o maior número de incêndios...


Há cerca de um ano vi um filme que, não sendo diretamente relacionado com este assunto, aborda as queimadas e o imenso mal que estão a criar, principalmente depois da guerra.
Into the Okavango é um documentário, produzido pela National Geographic, com imensa qualidade e que vale a pena ver.


A caminho do norte, entramos na província de Kwanza Sul pelo município da Cela.

A altitude, ao atravessar o vale do rio Keve (ou Queve, ou Cuvo, ...) ronda os 1300 m.
Dez anos passaram, mas este é um dos locais que me ficou na memória. 
Não ficou foi registado na memória da Nikon. As paisagens planas, apenas com uns "picos" lá ao fundo não dão grandes shots...
Uns quilómetros a jusante, valeria a pena as fotografias dos hipos.


Mas estes picos são mesmo picos a sério ;)
Este, que se destaca da montanha Waku, chega muito próximo dos 1900 m.
Mesmo no seu sopé, o hotel Lupupa Lodge. Ficou desfocadamente registado na fotografia imediatamente anterior a esta e por isso não teve direito a aparecer por aqui.
Tendo sido retratado na série Escapadelas por Angola, este hotel de luxo tem muito bom aspeto. Está localizado no meio de uma floresta de pinheiros e eucaliptos, mais típico de Portugal do que de Angola, mas muito agradável na sua verde frescura.



A província de Kwanza Sul e em particular o município da Cela, é das mais produtivas a nível agro-pecuário.
E nota-se!
Esta região central de Angola tem imensa água, imensos rios largos, planos, havendo campos agrícolas por todo o lado.
São quilómetros e quilómetros, a perder de vista...



A capital do município, a cidade de Waku Kungo (ou Uaco Cungo, ou ...) é que ainda não mostrava nenhum desenvolvimento.
Os sinais de abandono do tempo da antiga colónia continuavam evidentes. 
Na fotografia seguinte, um prédio destruído, com um dos incêndios/queimadas mesmo à sua porta (e à beira da estrada)


Não paramos por aqui, nem me lembro de termos abrandado, mas os sinais da antiga e importante cidade de Santa Comba eram diminutos a quem passava na estrada...



.... ou afinal até existam alguns sinais.
Depois de atravessar a parte mais antiga, surgia aquilo que tinha definido a cidade e que agora voltava a levantar-se: a agricultura e os meios instituídos para o desenvolvimento baseado na agricultura.

Ao pesquisar sobre este assunto e sobre a empresa que aparece na fotografia seguinte, a Novagro, apareceu uma informação muito interessante a vários níveis, para futura consulta: o relatório do desenvolvimento para a cooperação do sector privado Angola-Países Baixos.




20 dezembro 2020

Angola - #8.8

A caminho de Luanda, aí vamos nós.
Passava pouco das 11 e meia quando arrancamos definitivamente de Huambo.

Esta região central de Angola, planáltica, está bem lá em cima.
Do alto dos 1700 m, descíamos agora, lentamente, por entre afloramentos rochosos e flora tipicamente rasteira.
O primeiro registo, uma curiosidade: colunas naturais, que despontam no alto de um morro, a maior das quais com a inscrição da cerveja de Angola, e de Huambo, a Cuca.


Árvores que se destacam na paisagem. Mato rasteiro. Arbustos.
Pormenores.


E longas, longas retas.
Já disse longas?
Longas, tipo Alentejo, onde até as cores se chegam a confundir.


Mas o que não há no Alentejo são estas típicas cenas.
Mulheres, só mulheres, jovens e crianças, com os seus toscos pilões/martelos de pau, em cima de rochas graníticas.
A triturar, martelar, peneirar, milho ou mandioca, até fazer a fina farinha branca, fubá, base de alimentação da população das aldeias.


Ao longo de toda a estrada, memórias de outros tempos, muito presentes. 
Sempre presentes.
Casas grandes, prédios, destruídos pela guerra.


Mas a renovação já tinha começado e estava em andamento.
Ainda que quase toda a estrada, a EN120, já estivesse terminada e asfaltada, não o estava neste troço.
Passava-se numa pontezinha estreita, metálica, com aspeto militar, mas funcional.


Registo colorido do resultado dos fogos postos, que aqui já tinham passado.
Gostei do aspeto desta imagem, mas este é um assunto a voltar num próximo post.


Era já meio dia e um quarto.
Para quem já tinha arrancado há 5 horas, "apertava o ratinho"...
Paramos no Alto Hama, mesmo junto ao cruzamento com a EN250, que liga Lobito ao Cuíto (ou Kuito).
A trotinete de madeira era muito engraçada.


Se lá fora a limpeza não era muita, esperava-se que dentro do restaurante estivesse melhor.
E estava. Muito bom, mesmo!
E nem sequer era por terem Super Bock, que acompanhou o saboroso coelhinho ;)


Depois de uma rápida paragem, retornamos à estrada.
Mas não por muito tempo. Passados 5 min voltamos a parar.
Esta vista é incrível! 
Um monólito (esta palavra faz-me sempre lembrar o "2001: Odisseia no Espaço") granítico, gigante.
O monte Luvili, com o seu pico a mais de 2000 m de altitude.



Muito perto deste monte, as Águas Quentes.
Uma fonte de águas termais, quentes e sulforosas.
De entre as várias referências que consultei sobre isto deixo apenas esta, que achei interessante pelo facto de estar no Facebook. Quem diria, há 10 anos, que isto poderia acontecer ;)


Do outro lado da estrada, a vista para norte.
Na altura, por ali existia muito pouco. Agora, a vista do Google maps permite ver que ali cresceu uma aldeia de dimensão muito razoável.


Nas minhas pesquisas sobre este local, dei com esta referência, com um relato muito interessante da subida ao seu topo.
Não é fácil, mas deve valer a pena subir àquele pico!



13 dezembro 2020

Angola - #8.7

Saindo do interior do bairro de Benfica, voltamos à estrada principal.
As casas e edifícios mais importantes estavam por ali, mas nem assim as condições melhoravam. Muitas abandonadas, ainda à espera de melhores dias.

De pequenino se torce o pepino... e se dobra a mola.
Os miúdos, muitos com camisolas de clubes e/ou seleções de futebol, sempre coloridas.
A caminho da escola ou já na labuta, de venda de algum produto à beira da estrada.


Juntamente com a fotocópia, a reparação de motorizadas e de geradores elétricos, o negócio que melhor se pratica por Angola será o de escrita de painéis de marketing.
Repara.se todoti pomo.torizada :)


Mas o tuning de motorizadas não ficará muito atrás.
Esta Yamaha-Honda YB100, de um adepto do Primeiro de Agosto (clube de Luanda...) chamou-me a atenção ;)


Na EN120, para norte, alguns pormenores das casas, que mantêm a traça de meados do século XX.



Curta paragem à porta da Escola Primária Nº 111 - Benfica.
Foi aqui que o meu sogro frequentou a escola primária.
A única, curta, referência a esta escola que encontrei foi esta, de troca de mensagens de antigos alunos a tentarem reencontrar-se.


Duzentos metros à frente fizemos a última paragem em Huambo, no adro da igreja da Paróquia de São Paulo de Benfica, pertencente à Arquidiocese de Huambo.
Aproveitamos para um registo da "equipa" de viagem.




A maior curiosidade desta paragem, para mim, foi este sino.
Estava colocado no adro, pendurado numa espécie de "baliza de futebol", com 3 ganchos. 
Considerando que a igreja tem torre, talvez nunca tenham arranjado as condições para o colocar no seu interior.
Mas dá pena ver um sino de bronze assim, no exterior. Com 45 anos, não se encontrava já em grandes condições...


Construído na Fundição de Sinos de Rio Tinto, em 1965, foi oferecido pela Câmara Municipal da Póvoa de Varzim em homenagem pelas bodas de prata da Diocese de Nova Lisboa (o primeiro bispo desta diocese nasceu na Póvoa de varzim).
Sendo a fundição de sinos uma arte em fim de vida, gostei de ver que em 2019 foi apresentada na Universidade do Porto uma tese de mestrado sobre esta fundição e respetivos métodos de produção.


Mas eram já quase 11 e meia e tínhamos 600 km pela frente...

Ainda assim, havia tempo para palitar os dentes... ;)


... e para o registo dos últimos pormenores, na despedida desta cidade planalto, a 1700 m de altitude.

Uma oficina de pneus de beira da estrada, bem apetrechada para... remendar e voltar a encher o pneu.


Uma igreja Adventista do Sétimo Dia. 
Afastada da igreja, católica, de São Paulo, menos de 500 m, é nítida a diferença do número de frequentadores...


Ainda em Benfica, um bairro de paredes de adobe.


Já fora, mas ainda "às portas" de Huambo, mais um dos pontos que achei interessante, principalmente por ter sido um dos pontos de referência para localização geográfica.
Esta hospedaria/restaurante, 3 És, está muito mal cotada nos sites de pesquisa. 
Vá-se lá entender ;)


A caminho...